A Polícia Federal deflagrou
nesta sexta-feira (17/03) uma grande operação em alguns dos maiores frigoríficos
do Brasil. O que se revelou é assustador, fiscais corruptos do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento que deveriam zelar pela qualidade do alimento
consumidor pelos brasileiros, liberavam a venda de carnes podres e derivados
com ingredientes feitos de cabeça de porco, papelão, aditivos químicos e uma
sustância cancerígena que é o ácido ascórbico para “maquiar” as carnes que já
estavam estragadas.
Ao longo das investigações que
culminaram na Operação Carne Fraca, a Polícia Federal (PF) descobriu que os
frigoríficos envolvidos no esquema criminoso "maquiavam" carnes
vencidas com ácido ascórbico e as reembalavam para conseguir vendê-las. As
empresas, então, subornavam fiscais do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento para que autorizassem a comercialização do produto sem a devida
fiscalização. A carne imprópria para consumo era destinada tanto ao mercado interno
quanto à exportação.
“Tudo isso nos mostra que o
que interessa a esses grupos corporativos na área alimentícia é, realmente, um
mercado independente da saúde pública, independente da coletividade, da
quantidade de doenças e da quantidade de situações prejudiciais que isso [a
prática criminosa] causa”, afirmou o delegado federal Maurício Moscardi Grillo,
em entrevista coletiva no fim da manhã, na sede da PF em Curitiba. Também
participaram da coletiva o superintendente da corporação, Rosalvo Ferreira Franco,
o delegado Igor Romário de Paula e o auditor da Receita Federal Roberto Leonel
de Oliveira Lima.
Empresas envolvidas
Algumas das maiores empresas
do ramo alimentício do país estão na mira da operação, entre as quais a JBS,
dona de marcas como Big Frango e Seara, e a BRF, detentora das marcas Sadia e
Perdigão. A Justiça Federal no Paraná (JFPR) determinou o bloqueio de R$ 1
bilhão das empresas investigadas, que também são alvo de parte dos mandados de
prisão preventiva, condução coercitiva e busca e apreensão expedidos pela 14ª
Vara Federal de Curitiba.
Moscardi disse ainda que parte
do dinheiro pago aos agentes públicos abastecia o PMDB e o PP. A Polícia
Federal não identificou, no entanto, os políticos beneficiados pelo esquema,
nem a ligação entre os funcionários do Ministério da Agricultura e esses
partidos. “Não foi aprofundado porque o nosso foco era a saúde pública, a
corrupção e a lavagem de dinheiro”, explicou o delegado.
A PF também informou ter
interceptado um telefonema entre o ministro da Justiça, Osmar Serraglio, e o
ex-superintendente do Ministério da Agricultura no Paraná Daniel Gonçalves
Filho – um dos investigados pela corporação. A Polícia Federal informou que não
identificou, no entanto, ação criminosa por parte de Serraglio, que à época do
telefonema era deputado federal. “Por cautela, no entanto, foi necessário fazer
esse informe aqui para não sermos questionados”, disse Moscardi.
Investigação
A Operação Carne Fraca é
resultado de dois anos de investigações e foi divulgada pela PF como a maior
realizada na história da corporação. Mais de 1,1 mil policiais federais cumprem
309 mandados em sete unidades federativas: São Paulo, Distrito Federal, Paraná,
Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Goiás. Além das empresas que
participavam do esquema, a operação tem como alvo os fiscais do Ministério da
Agricultura que se beneficiaram do recebimento de propina e de vantagens
pessoais para liberar a venda da carne imprópria para consumo.
Além do repasse de dinheiro,
os agentes públicos recebiam como propina produtos alimentícios das empresas,
segundo a PF. Alguns, inclusive, já estariam começando a reclamar da qualidade
dos alimentos que ganhavam para fazer vista grossa na fiscalização.
O delegado Maurício Moscardi
ressaltou que a responsabilidade pelos atos criminosos é compartilhada por
empresários e agentes públicos. “Não havia uma relação de extorsão, mas sim de
benefício e de alimentação mútua entre eles. Os empresários também incentivavam
e se sentiam próximos desse esquema; eram corruptores”, afirmou.
Dentro do Ministério da
Agricultura, a PF descobriu que os funcionários envolvidos promoviam remoções
(transferências) de fiscais para garantir a continuidade do esquema criminoso.
A investigação começou, inclusive, depois que um fiscal se recusou a ser
removido ao descobrir fraudes em uma das empresas envolvidas.
Outro lado
Um dos alvos da Operação Carne
Fraca, o grupo JBS destaca, em nota oficial, que adota “rigorosos padrões de
qualidade” para garantir a segurança alimentar de seus produtos. “A companhia
repudia veementemente qualquer adoção de práticas relacionadas à adulteração de
produtos – seja na produção e/ou comercialização – e se mantém à disposição das
autoridades com o melhor interesse em contribuir com o esclarecimento dos
fatos”, diz o texto.
Saiba Mais
Justiça Federal no Paraná
bloqueia R$ 1 bilhão dos maiores frigoríficos do país
PF faz operação para combater
fraudes na fiscalização do setor de alimentos
Segundo a empresa, a ação
deflagrada hoje atingiu três unidades da companhia – duas no Paraná e uma em
Goiás. A JBS ressalta que “não há nenhuma medida judicial contra os seus
executivos”.
A BRF informou, em nota, que
está colaborando com as autoridades para o esclarecimento dos fatos. Segundo a
empresa, não há risco para os consumidores. "A companhia reitera que
cumpre as normas e regulamentos referentes à produção e comercialização de seus
produtos, possui rigorosos processos e controles e não compactua com práticas
ilícitas. A BRF assegura a qualidade e a segurança de seus produtos e garante
que não há nenhum risco para seus consumidores, seja no Brasil ou nos mais de
150 países em que atua."
Também em nota oficial, o
ministro da Agricultura, Blairo Maggi, diz que, diante dos fatos narrados na
operação, decidiu cancelar a sua licença de 10 dias do ministério. "Estou
coordenando as ações, já determinei o afastamento imediato de todos os
envolvidos e a instauração de procedimentos administrativos", informou.
"Todo apoio será dado à PF nas apurações. Minha determinação é tolerância
zero com atos irregulares no ministério", acrescentou.
Segundo Blairo Maggi, a
apuração da PF indica que os envolvidos no esquema ilegal praticaram "um
crime contra a população brasileira", que deve ser punido "com todo
rigor". "Muitas ações já foram implementadas para corrigir distorções
e combater a corrupção e os desvios de conduta, e novas medidas serão
tomadas." Para o ministro, no entanto, é preciso separar "o joio do
trigo" durante as investigações.
O Ministério da Justiça também
divulgou nota depois que a operação foi deflagrada. O texto afirma que a menção
ao nome de Osmar Serraglio na investigação é uma prova de que o ministro não
vai interferir no trabalho da Polícia Federal. “A conclusão, tanto do
Ministério Público Federal quanto do juiz federal, é que não há qualquer
indício de ilegalidade nessa conversa degravada”, ressalta a nota.
O PMDB, citado pela PF como
suposto beneficiário de parte da propina, diz que “desconhece o teor da
investigação, mas não autoriza ninguém a falar em nome do partido”.
Também citado como um dos
partidos que teria sido beneficiado por parte da propina arrecadada no esquema,
o PP disse que desconhece o teor das denúncias "O partido apoia minuciosa investigação e o rápido
esclarecimento dos fatos", afirmou o PP em nota.
Repercussão
No final da manhã, a
Confederação Nacional de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) emitiu nota
oficial assinada pelo presidente da instituição, João Martins da Silva Júnior.
No texto, a entidade defende a apuração dos fatos envolvendo frigoríficos e
fiscais agropecuários e que, uma vez comprovados, possam levar à punição
exemplar dos envolvidos.
A nota da CNA diz ainda que os
produtores rurais brasileiros têm dado “grande contribuição ao desenvolvimento
nacional” e afirma não ser justo que eles tenham a imagem “maculada pela ação
irresponsável e criminosa de alguns”.
Em nota, o Sindicato Nacional
dos Auditores Fiscais Federais Agropecuários diz que apoia a ação da Polícia
Federal. "A operação está alinhada aos objetivos de auditores fiscais federais agropecuários
no sentido de aprimorar a inspeção de produtos de origem animal no
Brasil". Segundo o sindicato, as denúncias constam de processo
administrativo que tramita no Ministério da Agricultura desde 2010.
Ministério afasta 33 servidores
O secretário executivo do
Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, Eumar Novaki, disse hoje
(17/03) que as fraudes no processamento de carnes por algumas das maiores
empesas do ramo alimentício do país, como JBS, BRF e Peccin, identificadas pela
Operação Carne Fraca, são um “fato isolado” e que os consumidores podem “ficar
tranquilos”.
Segundo o secretário, 33
servidores do órgão já foram afastados. De acordo com Novaki, a “maquiagem” de
produtos vencidos foi verificada em carne de frango, mortadela, salsicha e há a
suspeita de carne bovina. A fraude foi confirmada na unidade da BRF da cidade de
Mineiros (GO) e nos frigoríficos de Jaguará do Sul (SC) e Curitiba, da empresa
Peccin Agroindustrial. Os três estabelecimentos foram fechados pelo Ministério
da Agricultura e passarão por “inspeção rigorosa”.
“São 21 SIFs [Serviço de
Inspeção Federal], de quatro grupos econômicos, de um universo de 5 mil
estabelecimentos. Isso demonstra que não é um fato cotidiano, mas um fato
isolado, que não representa, de modo algum, a postura do Ministério da
Agricultura”, afirmou Novaki. Segundo o secretário, em até 15 dias, o
ministério apresentará um diagnóstico “preciso” sobre os produtos
comercializados pelas empresas investigadas.
Mesmo afirmando que os
consumidores podem ficar tranquilos quanto à procedência dos produtos, o
secretário recomendou que a população fique atenta a possíveis sinais de má
conservação. De acordo com Novaki, o
ministério está atuando para identificar e retirar do mercado lotes de produtos
adulterados.
“O queremos dizer para a
população é que fique absolutamente tranquila. Nosso sistema de fiscalização é
um dos mais respeitados do mundo. Se perceberem qualquer problema, comuniquem
ao Ministério da Agricultura, que tomaremos a providências.”
Exportações
Perguntado sobre o possível
impacto nas exportações, já que o Brasil é o principal exportador de carne do
mundo, o secretário executivo do Ministério da Agricultura disse que os países
compradores também fiscalizam os produtos. Além disso, Novaki reiterou que os
“fatos isolados” não podem comprometer toda a cadeia.
“Os produtos brasileiros estão
presentes em mais de 150 países, e isso demonstra a qualidade dos produtos
produzidos no país. Cada um dos países tem seu sistema de vigilância que atesta
os produtos quando lá chegam. Portanto, se tiver problema, isso será acionado e
será resolvido, e aquilo não será entregue.”
Com informações da Agência
Brasil e Sistema Redecol Brasil de Comunicação
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