Rádio não é aquele aparelho com botõezinhos, display digital (ou analógico) onde escolhemos o dial e controlamos o volume. Esse é só o aparelho receptor. Também não é uma antena, elementos, transmissor ou qualquer equipamento de transmissão. Sem isso o som não chega ao receptor, mas ainda não é rádio.
Rádio não é uma mesa de som de não sei quantos canais, um software de última geração, um espaço físico lindo, com acústica impecável, auditório e paredes e vidro. Uma emissora pode estar instalada no espaço mais luxuoso, no prédio mais bonito, no bairro mais chique, com gente bem vestida e coordenadores temperamentais: não. Isso não é necessariamente rádio. Um escritório de advogados pode superá-lo.
E a marca de uma rádio conhecida? Nesse caso estamos falando somente sobre a marca de uma rádio conhecida. É só isso: marca, recall, importante, mas não rádio. Outras empresas também tem seu próprio símbolo. Então rádio é música! Alguns podem dizer. Outros talvez digam: Não! O rádio é o locutor ou o comunicador que abre o microfone e fala. Desculpe a franqueza, mas isso também não é rádio. Se fosse, os carros de som com músicas irritantes em altíssimo volume intercaladas por "locutores" vendendo seus peixes também seria rádio. Mas não é.
O que é rádio então? Você pode responder?
O rádio pode se servir de todos esses elementos descritos acima. É claro que uma boa instalação, bons softwares, transmissores, equipamentos atuais são importantíssimos como mídia (meio) para que a rádio chegue á milhões de pessoas. Mas não devemos confundir meios com fins... É uma pena que os políticos e determinados religiosos não perceberam isso, mas esse é outro assunto.
Nosso assunto é o rádio e sobre isso eu tenho uma opinião: O rádio existe quando profissionais conseguem captar um senso coletivo, quando entendem anseios, medos, sonhos. Quando percebem onde está o "calcanhar de aquíles" de gente de todas as classes e níveis sociais, absorve, peneira, elabora, melhora, responde, questiona e devolve em forma de música, notícia, conversa, entretenimento, humor...o leque é infinito.
Rádio é gente falando com gente: interagindo, propondo, refletindo o inconsciente coletivo na linguagem específica de quem ouve. É saber porque fala e as razões de quem ouve sem perder a autenticidade e a verdade. É saber que toda estrutura física e financeira ajuda absurdamente, mas não é suficiente enquanto tratamos de uma mídia que tem como seu principal elemento de trabalho a imaginação.
Aliás no rádio isso é fundamental: Dar elementos para o ouvinte imaginar. É o tom de voz, a mudança de trilha, a descrição de um ambiente, o suspense que tira o folego, a revelação que faz chorar, a piada que faz rir, a reciprocidade no sotaque, ritmo, intenções.
É saber que cada palavra tem poder de criar mundos. É conduzir o ouvinte por caminhos que talvez desconheça, nos momentos mais simples, como a hora de desanunciar uma música por exemplo. É a capacidade de falar sem nenhum outro recurso a não ser o som. De descrever sem imagem, de criar a partir do silêncio.
No rádio falamos sem saber quem nos ouve. No rádio muitos ouvem sem saber quem fala. É fé: A certeza daquilo que não se espera e a convicção do que não se vê. Nós somos o rádio. Somos gente que fala com gente. Que ganha pouco, trabalha muito e ama o que faz. Para mim, isso é rádio. O resto ajuda, mas não faz.
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Texto: Flávio Siqueira.
Fonte: Nas Ondas do Rádio.
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